HOSPITAL RIO
 



ARTIGO
RADIAÇÕES IONIZANTES
Periculosidade ou insalubridade?

A matéria parece ser de simples solução, mas na realidade suscita debates intensos no judiciário. A maioria da comunidade jurídica entende que o manuseio de aparelhos de raios X acarretam o pagamento de adicional de insalubridade, entendimento que era acatado por grande parte dos juristas, que justificavam a sua tese no fato de que raio X NÃO EXPLODE. Tal conclusão preferimos não debater, pois, este estudo pretende analisar o fundamento jurídico da questão.
Quando exercia a chefia do departamento jurídico do Sindicato dos Odontologistas do Estado do Rio de Janeiro, ajuizei diversas ações postulando o pagamento de adicional de periculosidade aos dentistas que manuseavam aparelhos radiológicos. Apesar da apatia demonstrada pelos juízes a primeiro plano, todas as ações foram julgadas procedentes, seja em primeiro grau ou segunda Instância.
A solicitação do pagamento de adicional de periculosidade em razão da exposição do trabalhador às radiações ionizantes encontrava previsão legal na Portaria 3.393/87, do Ministério do Trabalho. Ocorre que discutia-se a eficácia jurídica desta portaria, pois, a sua redação conflitava com a própria definição de periculosidade, estabelecida no Artigo 193, da CLT, pois, esta seria a exposição do trabalhador ao risco de sinistro, conquanto que, a insalubridade se caracteriza pela nocividade à saúde provocada pelo agente agressor.
A tese adotada pelos julgadores que deferiam o pagamento da periculosidade em razão da exposição à radiação ionizante, era a de que o Artigo 200 da CLT, autorizava o Ministério do Trabalho a estabelecer medidas complementares ligadas às peculiaridades de cada atividade ou setor de trabalho, em especial àquelas que versassem sobre exposição à radiações ionizantes.
Faz-se oportuno acrescentar, todas as demais hipóteses de atividades perigosas encontram-se regulamentadas por LEI. Apenas a radiação ionizante foi inserida por intermédio de portaria, ou seja, o trabalho com inflamáveis e explosivos foi regulamentado pela Lei 6.514/77 e o trabalho com a energia elétrica através da Lei 7.369/85.
A questão parecia ter sido solucionada pela Portaria nº 496/2002, do Ministério do Trabalho e Emprego, que revogava a Portaria 3.393/87, uma vez que, a caracterização dessas atividades (radiação ionizante) como perigosas, nos termos da Portaria nº 3.393/87, não encontrava amparo no art. 193, caput, da CLT.
Todavia, o Ministério do Trabalho e Emprego editou uma outra portaria, a de nº 518/2003, restabelecendo o pagamento de adicional de periculosidade em relação às operações com radiações ionizantes, reeditando na íntegra a Portaria 3.393/87 e revogando a Portaria nº 496/2002. Ainda mais, o Governo Brasileiro aprovou a Convenção nº 115, da Organização Internacional do Trabalho, através do Decreto Legislativo nº 1, de 07.04.1964, sendo esta promulgada pelo Decreto 62.151, de 19.01.1968, instrumento normativo que não prevê o adicional de periculosidade para o trabalho com radiações ionizantes.
Cumpre-me confessar que tive de reformular o meu posicionamento, acatando as orientações do Ilustre doutrinador e jurista Sérgio Pinto Martins, que entende que o adicional de periculosidade só é devido em três casos: Por contato com inflamáveis, explosivo ou energia elétrica.
O pagamento do adicional de periculosidade só pode ser determinado por lei em obediência ao princípio da reserva legal (Artigo 5º, inciso II, da Constituição Federal), bem como é da competência exclusiva da união legislar sobre o direito do trabalho. Portanto, não pode uma portaria que não tem natureza de lei e nem é norma emitida pelo poder legislativo, realizar tal função.
A norma administrativa, como é o caso das portarias, tem por objetivo esclarecer o conteúdo da lei, regulamentá-la, sendo certo que o inciso VI do Artigo 200 da CLT e seu parágrafo único, citado pelos defensores do pagamento de periculosidades para atividades com radiações ionizantes, não estabelece o direito a adicional de periculosidade. Apenas faz menção a medidas especiais de proteção à saúde. Logo, a portaria nº 518/2003 extrapolou os limites de sua atuação.
A portaria do Ministro do Trabalho deve estar de acordo com a lei. Se ela excede os limites da lei e regulamenta demais, não tem qualquer valor.
Um dos fundamentos da Portaria nº 496/2002, do Ministério do Trabalho e Emprego era o fato de incumbir à Administração Pública a revisão dos atos administrativos ilegais ou inconvenientes. O mesmo pode ser feito em relação à Portaria nº 518/2003, pois ela é ilegal, isto é o que determina o Artigo 114, da Lei 8.112/1990: “a administração deverá rever seus atos, a qualquer tempo, quando eivados de ilegalidade”
A interpretação sistemática da CLT mostra que, se o Artigo 193 da CLT não prevê o pagamento do adicional de periculosidade para substâncias ionizantes ou radioativas, a norma administrativa não pode fazê-lo.
Convém acrescentar que já existe um projeto de lei nº 1.248/2003 pretendendo alterar o caput do Artigo 193 da CLT, incluindo, entre as atividades perigosas aquelas que impliquem a exposição a radiações ionizantes ou substâncias radioativas.
Assim sendo, enquanto a lei não estabelecer o direito ao adicional de periculosidade a exposição do trabalhador à radiação ionizante, este não fará jus a este pagamento, assim é o nosso humilde entendimento.
Oswaldo Munaro Filho - Munaro & Pereira Advogados Associados